A
Doença
A sífilis é uma doença infecciosa, sistêmica
de evolução crônica e sexualmente transmissível (DST), que desafia há séculos a
humanidade. De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), a sífilis,
permanece como um importante problema de saúde pública que acomete milhares de
pessoas em todo o mundo, embora há muito tempo, com a introdução da penicilina,
seja possível um tratamento eficaz e de baixo custo.
Esta doença pode apresentar várias
manifestações clínicas e diferentes estágios e se não houver tratamento ou
tratamento inadequado, pode espalhar-se pelo corpo e causar graves lesões em
praticamente todos os órgão e sistemas.
Como dito, a sífilis é uma doença transmitida
pela via sexual (sífilis adquirida) e verticalmente (sífilis congênita) pela
placenta da mãe para o feto. O contato com as lesões contagiantes pelos órgãos
genitais é responsável por 95% dos casos de sífilis. Outras formas de
transmissões mais raras são por transfusão sanguínea ou contanto direto com o
sangue contaminado e por via indireta (objetos contaminados).
A sífilis é um mal
silencioso e requer cuidados. Após a infecção inicial, a bactéria pode
permanecer no corpo da pessoa por décadas para só depois manifestar-se
novamente. Como única forma de prevenção desta doença, é importante o uso correto e regular da
camisinha masculina ou feminina. Além do acompanhamento da gestante durante o
pré-natal que contribui para o controle da sífilis congênita.
Foto:
Modos de transmissão da sífilis
Agente
Etiológico
A
sífilis é causada por uma bactéria gram-negativa com forma espiral do grupo das
espiroquetas chamada Treponema pallidum,
gênero Treponema, da família dos Treponemataceae.
O
T. pallidum é anaeróbia facultativa e catalase negativa, com cerca de 5-20μm de
comprimento e 0,1 a 0,2μm de espessura. Não possui membrana celular e é
protegido por um envelope externo. Apresenta flagelos que se iniciam na
extremidade distal da bactéria e encontram-se junto à camada externa ao longo do
eixo longitudinal. A bactéria move-se por rotação do corpo em volta desses
filamentos. A mesma não é cultivável, é patógeno exclusivo do ser humano e não
é resistente ao calor e a falta de umidade, não resistindo muito tempo fora do
seu ambiente.
Além
disso, a pequena diferença de densidade entre o corpo e a parede do T. pallidum
faz com que seja prejudicada sua visualização à luz direta no microscópio, pois
fracamente se cora, e por isso, a ideia do nome latim pallidum, que significa
pálido.
Histórico
Sua origem gera controvérsias
até hoje, duas teorias foram elaboradas na tentativa de explicar sua origem: as
teorias do Novo e do Velho Mundo. A primeira teoria afirma que a doença era
endêmica na América e que os marinheiros de Cristóvão Colombo a introduziram na
Europa. A teoria do Velho Mundo sustenta a tese de que a sífilis já existiria
em solo europeu e seria causada por um único tipo de microrganismo, e com o
passar do tempo a bactéria teria sofrido mutações e se tornado mais virulenta,
passível de ser transmitida por via sexual e, posteriormente, possibilitando o
desenvolvimento de epidemias.
Apesar destas polêmicas,
é comprovado, que no final do século XV teve início na Europa uma epidemia
gravíssima de sífilis, até então uma doença desconhecida. O termo sífilis
surgiu em 1530, em um poema de Girolamo Fracastoro cujo título era “Syphilis
sive morbus gallicus”, em que este descreve o mito do pastor Syphilus que
amaldiçoou o deus Sol e foi castigado com a doença. Porém, o nome sífilis só
começou a ser usado realmente no final do século XVIII.
No Brasil, antigos
estudiosos afirmam que a sífilis não existia aqui antes da descoberta,
atribuindo aos brancos sua introdução e a estes e aos negros a disseminação da
doença através do contato sexual com as índias e negras.
Além disso, em virtude de
não haver estatísticas, muitos médicos acreditavam haver uma enorme incidência
de sífilis entre a nossa população. Em parte, isso deve-se ao fato da
inexistência de um diagnóstico preciso para a doença.
Sinais
e Sintomas
A sífilis alterna
períodos de atividade com características clínicas, imunológicas e
histopatológicas distintas, ou seja, períodos sintomáticos: sífilis primária,
secundária e terciária; e período assintomático: sífilis latente. Ainda podendo
existir a sífilis congênita e a neurossífilis.
·
Sífilis Primária
O período de incubação, ou seja, o intervalo de tempo entre o contágio e
os primeiros sintomas, é em média de 2 a 3 semanas. Todavia, há caos em que
este intervalo pode ser de três dias ou três meses.
A lesão específica da sífilis é inicialmente uma pápula de cor rósea,
geralmente nos órgãos genitais, que evolui em poucas horas em uma úlcera não
dolorosa, que recebe o nome de cancro duro. Em geral o cancro é único,
praticamente sem manifestações inflamatórias perilesionais, bordas induradas,
que descem suavemente até um fundo liso e limpo, recoberto por material seroso.
No homem é mais comum localizar-se no sulco balanoprepucial, prepúcio,
meato uretral ou mais raramente intra-uretral. Na mulher é mais frequente nos
pequenos lábios, parede vaginal e colo uterino. As localizações extragenitais
mais comuns são a região anal, boca, língua, região mamária e quirodáctilos.
O cancro regride espontaneamente em período que varia de quatro a cinco
semanas sem deixar cicatriz, levando a falsa impressão de cura espontânea.
Portanto, é comum que essa doença passe despercebida pelo portador, fazendo com
que o mesmo não procure ajuda médica e desse modo, proporciona a bactéria que
ela se multiplique pelo organismo silenciosamente.
·
Sífilis Secundária
Após período de latência que pode durar de seis a oito semanas, a doença
entra novamente em atividade. O acometimento afeta a pele e os órgãos internos
correspondendo à distribuição do T. pallidum por todo o corpo. Na pele, na
boca, no nariz, mas principalmente nas palmas das mãos e nas plantas dos pés,
as lesões podem apresentar-se sob a forma de máculas de cor avermelhada de
duração efêmera. Além de ser
caracterizada por provocar descamações na pele, gerar ínguas (na região
genital) e causar dor de cabeça, dor muscular, dor de garganta, mal-estar,
febre baixa, falta de apetite e perda de peso.
A fase secundária evolui no primeiro e
segundo ano da doença com novos surtos que regridem espontaneamente entremeados
por períodos de latência cada vez mais duradouros. Por fim, os surtos
desaparecem, assim como na sífilis primária, e um grande período de latência se
estabelece. Estudos mostram que um terço dos pacientes obtém a cura clínica e sorológica,
outro terço evolui sem sintomatologia. E, num último grupo, a doença volta a se
manifestar (sífilis terciária).
·
Sífilis Latente
Após o desaparecimento da
sífilis secundária, o paciente entra na fase latente da doença. Correspondente
ao estágio inativo da sífilis. Não há sintomas, mas os testes laboratoriais
ainda são positivos. A duração é variável, podendo ser interrompida pelo
surgimento de sinais e sintomas da forma secundária ou terciária (a mais grave
de todas). A fase latente é dividida em latente precoce, quando a contaminação
pelo Treponema pallidum tem menos de um ano, ou latente tardia quando a
infecção tem mais de um ano.
·
Sífilis Terciária
Esta nova fase, quando os sintomas retornam, é chamada
de sífilis terciária. Ela pode surgir de 2 a 40 anos depois do início da
infecção. Os pacientes nessa fase desenvolvem lesões, em pequeno número,
assimétricas, endurecidas e bem marcadas, localizadas envolvendo pele e
mucosas, sistema cardiovascular e nervoso, podendo levar à morte. Em geral a
sífilis terciária apresenta três tipos de manifestações características das
lesões:
- Goma sifilítica =
grandes lesões ulceradas que podem acometer pele, ossos e órgãos internos.
- Sífilis cardiovarcular
= acometimento da artéria aorta, causando lesões na mesma.
- Neurossífilis = acomete
o sistema nervoso, levando à demência, meningite, AVC e problemas motores por
lesão da medula e dos nervos.
Sífilis Terciária
·
Sífilis
Congênita
A sífilis congênita é quando o embrião é
infectado, por transmissão vertical, com o T. pallidum (sífilis) ainda durante
a gestação. Isso acontece quando a gestante infectada não foi tratada ou não
possuiu tratamento adequado para a doença. A infecção do embrião pode ocorrer
em qualquer fase gestacional ou estágio da doença materna. Os principais
fatores que determinam a probabilidade de transmissão são o estágio da sífilis
na mãe e a duração da exposição do feto no útero.
De
acordo com o boletim epidemiológico de sífilis fornecido por uma pesquisa do Departamento de Vigilância, Prevenção e
Controle das IST, do HIV I Aids e das Hepatites virais, em 2016, 15.247
casos de sífilis em gestantes e 9.201 casos de sífilis congênita em menores de
um ano de idade foram detectados no Brasil.
Além
disso, uma pesquisa realizada em 2011-2012 através de dados do estudo Nascer Brasil, estimou uma taxa de
transmissão vertical de 34,3% em casos de sífilis na gestação e sífilis
congênita identificados. Sabe-se que a transmissão vertical da sífilis
apresenta valores distintos conforme a fase da doença materna e além de ser uma
taxa elevada, 33,9% dos recém-nascidos com diagnóstico de sífilis congênita
apresentaram desfechos negativos, valor 2,5 vezes superior ao observado em
mulheres sem infecção pela sífilis.
Nesta
mesma pesquisa, verificou-se que mulheres com transmissão vertical da infecção
apresentaram fatores que influenciaram a propagação da doença, como o início
mais tardio da assistência pré-natal, menor proporção de número adequado de
consultas, menor realização de uma ou duas sorologias para sífilis e menor
registro de sorologias reagentes no cartão de pré-natal.
Logo, a sífilis congênita, se não tratada, pode levar a
diversas complicações, como: aborto espontâneo, parto prematuro, má formação do
feto, surdez, cegueira, deficiência mental e/ ou morte ao nascer. Para evitar
estes agravantes, recomenda-se que o tratamento
da sífilis congênita no recém-nascido seja feito o mais rápido possível, com
injeções de penicilina G benzatina ou benzilpenicilina benzatina. No
entanto, as doses e duração do tratamento variam de acordo com o risco de
infecção do bebê, sendo que o tratamento mais longo dura até 14 dias.
Diagnóstico
A sífilis pode ser
diagnosticada por um teste rápido (TR) que é um teste imunocromatográfico,
treponêmico, de uso para detecção de anticorpos específicos para Treponema
pallidum. Pode ser realizado com amostra de sangue total, soro ou plasma. Este
teste está disponível nos serviços de saúde do SUS, sendo prático e de fácil
execução, com leitura do resultado em, no máximo, 30 minutos, sem a necessidade
de estrutural laboratorial.
Porém, para um
diagnóstico mais preciso da sífilis são necessários exames laboratoriais
baseados em exames de microscopia e exames sorológicos, sendo escolhidos considerando
a fase evolutiva da doença. Por microscopia, pode ser realizada a coleta
adequada de material nas lesões (fases primária e secundária) pela técnica em
campo escuro ou pela Imunofluorescência direta. Nos exames por sorologia,
tem-se a sorologia não treponêmica (VDRL e RPR) e a sorologia treponêmica
(FTA-abs , MHA-tp ou TPHA, ELISA).
Na sífilis congênita, além dos exames acima, devem ser
solicitados também o hemograma completo, raio X de ossos longos e exame do
líquido céfalo-raquidiano ou líquor (LCR) para análise da celularidade,
proteínas e a realização do VDRL.
Teste rápido para sífilis
Tratamento
Em 2016, a Organização
Mundial da Saúde (OMS) recomendou um novo uso de antibiótico, a penicilina,
devido ao aumento da resistência dos microrganismos aos medicamentos
(antibióticos) usados.
O tratamento da sífilis,
então, é feito com penicilina que age interferindo na síntese do
peptidoglicano, componente da parede celular do T. pallidum. O resultado é
entrada de água no treponema, o que acaba por destruí-lo. Nas três fases da
sífilis recomenda-se o tratamento com penicilina benzatina.
Nos casos de alergia à
penicilina, o teste intradérmico deverá ser feito, bem como, nos casos
comprovados, dessensibilização com a penicilina. Caso essas medidas não sejam
possíveis, deverão ser utilizadas drogas alternativas como: Doxiciclina 100mg,
2x dia, por 30 dias, ou tetraciclina 500mg, 6/6 horas (VO) ou eritromicina 500
mg, 6/6H (VO), por 15 dias.
Em casos de neurossífilis
deve-se usar a Penicilina G aquosa, 18-24 milhões UI por dia, por via
endovenosa, administradas em doses de 3-4 milhões UI, a cada 4 horas ou por
infusão continua, por 14 dias. Caso, haja alergia pelo paciente, utiliza-se a Penicilina
procaína, 2,4 milhões UI, IM, uma vez ao dia mais probenecide 500 mg VO, 6/6,
ambos por 10-14 dias.
Como não há garantia de
que outras drogas consigam tratar a gestante e o feto de forma tão eficaz
quanto a penicilina, impõe-se a dessensibilização e o tratamento com penicilina
para gestantes com alergia confirmada à penicilina. Não havendo possibilidade
de dessensibilização, a mãe pode ser tratada com estearato de Eritromicina
500mg, 4x dia, por 14 dias se sífilis recente e 30 dias, se sífilis tardia. A
eritromicina por não atravessar a barreira placentária, não trata o feto. Após
o parto, a gestante deverá ser tratada novamente com Doxiciclina (100mg, 2x dia
por 30 dias).
Após o início do
tratamento as lesões começam a desaparecer já nos primeiros dias. Porém para se
confirmar a cura é preciso repetir os exames de sangue.
O tratamento da sífilis
congênita deverá ser realizado conforme o quadro abaixo:
Sífilis
no Brasil
A sífilis, apesar de ter
um tratamento rápido, voltou a ser uma epidemia no Brasil. Esse aumento ocorre
especialmente nos centros urbanos e entre os jovens, o que preocupa
especialistas. Esse fenômeno não é particularidade do Brasil, a Organização
Mundial da Saúde estima que quase seis milhões de pessoas são infectadas pela
sífilis.
No Brasil, ainda há um
grande desconhecimento da doença, não só em relação aos riscos, como em relação
às consequências da mesma. Além disso, a população mais jovem, por não ter
vivido a epidemia de sífilis nas décadas anteriores e por considerar a doença
como antiga, se descuida nos métodos de prevenção e assim provoca a propagação
da sífilis.
A sífilis, como dito
anteriormente, é uma doença silenciosa que está entre nós, logo, todas as
medidas de prevenção devem ser tomadas para que a mesma não se propague.
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Bem nojento, mas muito bom trabalho !
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