segunda-feira, 17 de julho de 2017

Hanseníase – Trabalho de Microbiologia Clínica – 2017.1

Por  Tainah Almeida

 


Fatos Históricos
  Doenças que hoje conhecemos por psoríase, eczema e outras dermatoses na antiguidade eram referidas como hanseníase. Estas são majoritariamente caracterizadas por lesões escamosas enquanto a lepra, termo não mais utilizado,  obtém destaque maior por associações em relação a suas deformidades.
Em traduções bíblicas ainda se encontra a palavra lepra, descrevendo doenças que são diferentes da hanseníase. Por essa razão e pela palavra lepra ter um sentido pejorativo e preconceituoso, estando associada a ideia de impureza e repugnância, passou-se a denominar a doença por hanseníase, em homenagem ao descobridor da bactéria – Mycobacterium leprae, causadora da infecção.
  Em 1874, o médico e botânico norueguês, Gerhard Henrik Armauer Hansen, demonstrou as chamadas células leprosas de Virchow encontradas nos nódulos cutâneos da doença. Este fato deu início a um novo conceito sobre a doença e seu modo de transmissão e os doentes passaram a ser decisivamente visto como ameaça social, desencadeando o processo de higienização da sociedade, através do confinamento compulsório dos doentes em leprosários. A primeira tese derrubada após este evento foi a de que a doença era hereditária e não contagiosa. Sob o ponto de vista de que o doente passou a ser considerado como a única fonte de propagação da moléstia.
  Na Idade Média, a hanseníase manteve alta prevalência na Europa e no Oriente Médio. O Concílio de Lyon realizado pela Igreja Católica, no ano de 585, estabeleceu o isolamento do doente da população sadia como regra de profilaxia da doença. Em alguns locais, essa medida foi bastante rigorosa e incluía a realização de um ofício religioso em intenção do doente, semelhante ao ofício dos mortos, após o qual ele era excluído da comunidade, passando a residir em locais especialmente reservados para este fim, foram os primeiros asilos para acolher os acometidos por esta doença. O doente era ainda obrigado a usar roupas características que o identificavam como tal e fazer soar uma sineta ou matraca para avisar os sadios de sua aproximação.
  O declínio dessa doença, na Europa, foi gradual tendo se iniciado a partir do século XVII. Por volta de 1870, a doença já havia praticamente desaparecido em quase todos os países da Europa e a causa mais provável desse desaparecimento foi a melhoria das condições socioeconômicas. Apesar disso, a endemia estava persistindo no território asiático e africano, tendo sido introduzida no Novo Mundo a partir das conquistas espanholas e portuguesas e da importação de escravos africanos.
  Na Primeira Conferência Internacional de Lepra, em Berlim, no ano de 1897, foi proposto o isolamento compulsório como o melhor meio de impedir a propagação da doença, e recomendou-se a notificação obrigatória e a vigilância dos suspeitos, tais como se praticam na Noruega. As práticas que se seguiam na Noruega desde 1825, indicava como profilaxia da lepra, o isolamento tanto em domicílio quanto em leprosários. Aos leprosos que tivessem recursos para se manter, as autoridades podiam  permitir que vivessem em seus domicílios, apenas afastados de seus  familiares e de suas relações, tendo ao menos um leito ou um quarto separados. Também era recomendado o afastamento dos doentes de profissões que lidassem com o público e a separação dos seus filhos logo após o nascimento, sendo recolhidos em preventórios especiais.

Tipos de Hanseníase


  A Hanseníase é classificada de acordo com suas manifestações clínicas e o resultado da baciloscopia. De acordo com este últimos, os pacientes que apresentam baciloscopia negativa em todos os locais de coleta são classificados como Paucibacilar (PB), enquanto aqueles que apresentam baciloscopia positiva em qualquer local de coleta são classificados como Multibacilar (MB).
  De acordo com os critérios clínicos, foram identificadas quatro formas da doença:
·         Hanseníase Indeterminada
-   Corresponde a forma inicial;
-   Evolui espontaneamente para a cura, na maioria dos casos;
-   Geralmente se encontra apenas uma lesão, de cor mais clara que a pele normal, com diminuição da sensibilidade.

·         Hanseníase Tuberculóide
-   É a forma mais benigna e localizada;
-   Acomete pessoas com alta resistência ao bacilo;
-   Encontram-se poucas lesões de limites bem definidos e um pouco elevados e com ausência de sensibilidade; neste caso, ocorrem alterações nos nervos próximos a lesão, podendo acarretar dores, fraqueza e atrofia muscular.

·         Hanseníase Dimorfa
-   É a forma intermediária;
-   Há um maior número de lesões;
-   As manchas podem atingir grandes áreas da pele;
-   Os nervos são bastante afetados;
-   Esta pode polarizar para Virchoviana ou Tuberculóide.
·         Hanseníase Virchoviana
-   Neste tipo, a imunidade é nula e há uma maior multiplicação do bacilo, isto faz com que o paciente possa chegar a um quadro de maior gravidade, podendo anestesiar os pés e as mãos; sem a sensibilidade, poderão ocorrer traumatismos e feridas que poderão acarretar deformidades, atrofia muscular, inchaço nas pernas e surgimento de nódulos;
-   Órgãos internos também podem ser atingidos pelas consequências da doença.

A Transmissão

  A transmissão da hanseníase se dá pelo contato prolongado e frequente com uma pessoa infectada pelo bacilo e que não esteja em tratamento. A pessoa infectada expele bacilos através do sistema respiratório superior quando ela fala, tosse ou espirra. É uma doença de baixa infectividade, e, por conta disto, apenas o contato por vários anos e frequente com a pessoa infectada é capaz de ocasionar a transmissão da doença. Quando a pessoa inicia o tratamento para erradicar a doença, a transmissão é interrompida. Logo, quanto mais cedo a doença é diagnosticada, mais rápido o tratamento poderá ser iniciado.

  Ninguém que tenha a doença precisa se afastar da sociedade, nem deixar de trabalhar ou ficar perto de sua família.
A maioria da população adulta é resistente à hanseníase, contudo, as crianças são mais susceptíveis, geralmente adquirindo a doença quando há um paciente contaminante na família. O período de incubação varia de 2 a 7 anos e entre os fatores predisponentes estão o baixo nível socioeconômico, a desnutrição e a superpopulação doméstica.

Sinais e Sintomas

  Os sinais e sintomas da hanseníase estão localizados principalmente nas extremidades das mãos e dos pés, na face, nas orelhas, nas costas, nas nádegas e nas pernas.
 Os sinais e sintomas mais comuns da hanseníase são:
·         Manchas esbranquiçadas, avermelhadas ou amarronzadas em qualquer parte do corpo.
·         Área de pele seca e com falta de suor;
·         Área da pele com queda de pelos, mais especialmente nas sobrancelhas;
·         Área da pele com perda ou ausência de sensibilidade (dormências, diminuição da sensibilidade ao toque, calor ou dor);
neste caso, pode ocorrer de uma pessoa se queimar no fogão e nem perceber, indo verificar a lesão avermelhada da queimadura na pele mais tarde;
·         Parestesias (sensação de formigamento na pele, principalmente das mãos e dos pés);
·         Dor e sensação de choque, fisgadas e agulhadas ao longo dos nervos dos braços e das pernas;
·         Edema ou inchaço de mãos e pés;
·         Diminuição da força dos músculos das mãos, pés e face devido à inflamação de nervos, que nesses casos podem estar engrossados e doloridos;
·         Úlceras de pernas e pés;
·         Nódulo no corpo (podendo ser avermelhados e dolorosos, em alguns casos).

Diagnóstico
  O diagnóstico da hanseníase é essencialmente clínico. Este depende do reconhecimento dos sinais da doença, portanto só é possível quando a doença se manifesta. A Organização Mundial da Saúde estabeleceu critérios de diagnóstico, considerando-se a pessoa que apresenta um ou mais dos seguintes sinais: aparecimento de manchas hipopigmentadas ou avermelhadas com alterações de sensibilidade com pesquisa de bacilos em esfregaço de linfa (baciloscopia) e exame histopatológico das lesões cutâneas. Além do diagnóstico clínico, existem outras ferramentas convencionais para elucidação da hanseníase. Dentre eles, a baciloscopia, o teste cutâneo e o exame histopatológico. Uma das ferramentas inovadoras no diagnóstico da hanseníase é o teste sorológico, baseado na detecção de anticorpos específicos, quase universalmente positivos em pacientes MB, mas têm uma sensibilidade insuficiente para a definição diagnóstica em pacientes PB.
  Além dos métodos de diagnósticos convencionais descritos, a sorologia e reação da cadeia de polimerase (PCR) têm sido utilizadas para o diagnóstico da hanseníase, apesar de nenhum destes testes mostrarem sensibilidade e especificidade como ferramentas de diagnóstico de rotina. As vantagens principais da sorologia e do PCR é que se tem uma resposta rápida e é possível utilizar amostras biológicas sem a necessidade de isolamento ou crescimento em cultura. Em vista disso, fazem-se necessárias ferramentas específicas para se diagnosticar a infecção pelo Mycobacterium leprae, antes mesmo do aparecimento dos sinais clínicos. Mediante o exposto, esta pesquisa buscou apresentar as ferramentas convencionais e as inovações para o diagnóstico da hanseníase.

Tratamento
  Ambos os tipos (paucibacilar e multibacilar) são tratados com o antibiótico rifampicina, durante seis meses no tipo paucibacilar e um ano no tipo multibacilar. A medicação é fornecida gratuitamente pelo Ministério da Saúde e administrada em doses vigiadas nas Unidades Básicas de Saúde sob a supervisão de médicos ou enfermeiros de acordo com normas da OMS.
  A rifampicina tem capacidade de eliminar 90% dos bacilos. Por conta disto, é necessário complementar o tratamento com outra droga (DDS), que pode ser tomada em casa diariamente, até o final do tratamento. Nos casos multibacilares, esse tratamento é acrescido de uma dose diária e de outra vigiada de clofazimina.

Resistência ao tratamento
  Segundo informações do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), 8% dos casos de recidiva, quando a doença retorna após a conclusão do tratamento, se devem justamente a bactérias resistentes. Em 2012, foi publicado um estudo com base em casos de pacientes com recidiva após o tratamento nas cinco regiões do país e que foram analisados em centros de referência. Neste conjunto, foi detectada uma taxa de 4,3% de infecções provocadas por bactérias resistentes. Entre esses casos, havia um de multirresistência: o M. leprae que infectava aquele paciente era resistente a dois dos três compostos da poliquimioterapia. A resistência a apenas um dos medicamentos da poliquimioterapia é suficiente para prejudicar a eficácia do tratamento, especialmente se houver resistência à rifampicina, que é o fármaco com atividade microbicida mais potente na combinação. Quando esse medicamento não funciona, os outros dois fazem efeito, mas não de forma suficiente. Sempre que a resistência é confirmada, os medicamentos envolvidos são substituídos.
  A resistência adquirida é a mais comum. Esta ocorre em pacientes que abandonam a terapia ou fazem uso dos medicamentos de forma irregular. Uma vez que o tratamento não é capaz de eliminar as bactérias, acontece a seleção de microrganismos resistentes, que passam a se multiplicar. Quando essas bactérias são transmitidas para outras pessoas, temos os casos de resistência primária, em que o paciente apresenta um microrganismo resistente antes mesmo de ser submetido ao tratamento.
  A investigação é recomendada em duas situações: quando se detecta que o tratamento não está funcionando e quando ocorrem recidivas. Considerando que, mesmo após o início do uso de medicamentos, a regressão das lesões da hanseníase é naturalmente demorada, pode ser difícil perceber que um paciente está levando mais tempo para se recuperar. Já os quadros de recidiva precisam ser diferenciados das reações inflamatórias, que podem ocorrer após o fim do tratamento. Nesses casos, é como se o sistema imunológico do paciente continuasse respondendo à infecção, mesmo após a morte das bactérias, provocando danos ao organismo. Para confirmar a recidiva, são necessárias avaliação clínica e análise histopatológica do tecido da lesão. Se houver confirmação da recidiva, a investigação de resistência é realizada.




Bibliografia

[1].      Antunes DE, Ferreira GP, Nicchio MV, Araujo S, Cunha AC, Gomes RR, Costa AV, Goulart IM. Number of leprosy reactions during treatment: clinical correlations and laboratory diagnosis. Rev. Soc. Bras. Med. Trop.,  Uberaba ,  v. 49, n. 6, p. 741-745,  Dec.  2016 .  

[2].      SOUZA, Vivian Fichman Monteiro de et al. Relato de três casos novos de hanseníase em menores de quinze anos no município de Itaguaí, Rio de Janeiro: evento de alerta para investigação epidemiológica. An. Bras. Dermatol.,  Rio de Janeiro ,  v. 86, n. 5, p. 1011-1015,  Oct.  2011 .

[3].      EIDT, Letícia Maria. Breve história da hanseníase: sua expansão do mundo para as Américas, o Brasil e o Rio Grande do Sul e sua trajetória na saúde pública brasileira. Saude soc.,  São Paulo ,  v. 13, n. 2, p. 76-88,  Aug.  2004 .

[4].      Virmond MCL. Alguns apontamentos sobre a história da prevenção e reabilitação de incapacidades e reabilitação em hanseníase no Brasil. Hansenologia Internationalis 2008;33(2 Suppl. 1):13-18

[5].      Meima A, Irgens LM, Oortmarssen GJ, Richardus JH, Habbema JD. Disappearance of leprosy from Norway: an exploration of critical factors using an epidemiological modelling approach. International Journal of Epidemiology 2002; 31:991-1000.

[6].      Nardi SMT, Marciano LHSC, Virmond MCL, Baccarelli R. Sistemas de informação e deficiências físicas na hanseníase. Boletim Epidemiológico Paulista 2006;3:3-7

[7].      Andrade VL. Evolução da hanseníase no Brasil e perspectivas para sua eliminação como um problema de saúde pública [tese de Doutorado]. Rio de Janeiro (RJ): Fiocruz; 1996


[8].      Oliveira MHP, Romanelli G. Os efeitos da hanseníase em homens e mulheres: um estudo de gênero. Cadernos de Saúde Pública 1998;14:51-60

Este trabalho foi feita pela aluna Taina

Nenhum comentário:

Postar um comentário