Descrita pelo alemão Arthur Nicolaier em 1884, o tétano é uma doença infecciosa, não contagiosa, causada por um bacilo denominado Clostridium Tetani, que produz uma exotoxina chamada tetanospasmina, capaz de atingir o Sistema Nervoso Central após entrar na corrente sanguínea. A doença caracteriza-se por hipertonia da musculatura estriada, generalizada ou não, atingindo de preferência , os seguintes músculos estriados: masseteres, musculatura da coluna vertebral , músculo da nuca e músculos da parede anterior do abdômen. Essa contratura permanente se intensifica, constituindo o que se denomina espasmo ou convulsão tônica, o mais temível sintoma da doença.
Etiologia
O Clostridium tetani é considerada a o agente etiológico do Tétano. A bactéria é isolada de amostras de solo, fezes de animais e humanos. É um bacilo anaeróbio estrito, produtor de esporo que lhe permite sobreviver em condições de aerobiose e produtor de um a exotoxina que se fixa ao sistema nervoso, provocando a sintomatologia da doença. O bacilo é comumente encontrado na natureza sob a forma de esporo, nos seguintes meios: terra ou areia, em especial quando contaminadas com fezes de animais; reino vegetal (em espinhos de arbustos e pequenos galhos de árvores); águas putrefatas; pregos enferrujados; instrumentos de lavoura; latas velhas contaminadas com poeira de rua ou terra; fios de categute e agulhas de injeção não convenientemente esterilizadas. A multiplicação do bacilo é coadjuvada pela ação de certas substâncias (ácido láctico, sais de cálcio, quinina) que baixam o potencial de oxirredução dos tecidos.
Aspectos Morfológicos
O agente etiológico
como já dito é o Clostridium Tetani, um
bacilo gram-positivo, esporulado, morfologicamente semelhante a um alfinete de
cabeça. A sua morfologia sofre variações em função do meio de cultura, da
presença ou não de oxigênio e do tempo de cultivo. Não é fácil o seu isolamento
em cultura pura uma vez que há grande frequência de flora anaeróbia esporulada
ao seu lado nos focos de infecção, bem como de outros germes anaeróbios
facultativos.
O bacilo apresenta
uma forma vegetativa e outra esporulada. A forma vegetativa se apresenta como
um bacilo de superfícies arredondadas, com largura variando de 0,3 a 0,6 μ e de
comprimento em geral de 0,2 a 0,5 μ. Não raramente, é encontrado sob a forma
filamentosa em culturas jovens, tais formas entrando em divisão rapidamente. As
formas bacilares que não formam esporos gradualmente vão perdendo sua afinidade
pelos corantes e em alguns dias tornam-se autolisadas. O desenvolvimento dos
esporos em culturas sofre variações. Algumas amostras esporulam rapidamente,
enquanto que outras o fazem lentamente. As cepas que formam esporos
rapidamente, em geral o fazem no 2º dia de incubação em ágar sangue; nas
amostras de esporulação tardia, os esporos aparecem no 5º ou 6º dia. A
morfologia do esporo depende do estado de desenvolvimento. Inicialmente tem
forma oval, localizado em uma das extremidades do bacilo e não retém a fucsina.
Em seguida toma o aspecto esférico e se cora intensamente pela fucsina. O
remanescente do citoplasma que originariamente cercava o esporo desaparece, com
exceção da parte distai onde permanece uma pequena porção. O contorno do
esporo é usualmente mais escuro que em outros bacilos esporulados. O esporo só
adquire a maturidade quando o centro não mais adquire coloração, mostrando que
a capa externa está completamente constituída.
(Morfologia da Bactéria) |
A Toxina Tetânica
O C. tetani produz três toxinas: uma
tetanospasmina neurotóxica; uma neurotoxina não convulsivante; e uma
tetanolisina. Dessas três toxinas, aquela incriminada na patogenia do tétano
humano é a tetanospasmina. As outras duas não são suficientemente estudadas e
a maioria dos autores não lhes fazem
referencia.
A tetanospasmina é
a toxina considerada pela grande maioria dos autores como a porção de
importância na patogenia do tétano. É uma proteína com peso molecular
67000kDa, que apresenta alta especificidade de ação, ligando-se somente a
receptores nas células nervosas. É termolábil e é a segunda toxina mais potente
que se conhece, sendo que 0,000001 ml de um filtrado potente é capaz de matar
um camundongo. A dose letal mínima para o homem é de 0,1 a 0,25 mg. Não é
absorvida pelo tubo digestivo e é destruída pelos sucos digestivos, uma vez que
é alterada por ação de ácidos e sofre a ação de enzimas proteolíticas.
A toxina tetânica é
produzida no interior da célula bacteriana, onde permanece por 1 ou 2 dias,
sendo liberada por permeabilidade da
membrana. A quantidade de toxina liberada pelo rompimento de células jovens é
muito menor que a liberada por bactérias no 3º ou 4º dia de cultivo. Tal fato
tem implicações terapêuticas, pois a penicilina utilizada no tratamento do
tétano, ao provocar o rompimento de célula bacteriana provoca uma súbita
liberação de toxina que pode agravar o quadro clínico.
(A toxina tetânica possui 4 domínios distintos) |
Resistência do C.
Tetani
Na sua forma
vegetativa o C. tetani é rapidamente
destruído por ação do calor e de desinfetantes. Ele é ainda sensível à ação da
penicilina, tetraciclinas, eritromicina e é resistente à ação da estreptomicina
e polimixinas. Já na forma esporulada o bacilo apresenta m arcada resistência à
ação do calor, ressecamento e desinfetantes. No solo seco o esporo tetânico
vive durante anos, assim como é possível seu isolamento de feridas contaminadas
após muito tempo. Os esporos resistem à fervura por 15 a 90 minutos, sendo
destruídos à temperatura de 105°C em 3 a 25 minutos.
Diagnóstico
O
tétano é doença que não conta com muito apoio de laboratório para o seu
diagnóstico. Este deve ser formulado apenas em face de um conjunto de elementos
epidemiológicos e clínicos. Os dados epidemiológicos dizem respeito à natureza
do ferimento e à zona geográfica onde o mesmo ocorreu (probabilidade de
presença de esporos tetânicos no meio ambiente). São considerados como
prováveis focos tetagênicos os ferimentos superficiais ou profundos, de
qualquer natureza, que tenham estado em contato com poeira de rua ou terra e as
fraturas expostas contendo restos de tecidos desvitalizados.
Diagnóstico Diferencial
O tétano comporta
diagnóstico diferencial com as seguintes doenças:
- · Processos inflamatórios da região bucofaringea acompanhados de trismo.
- · Meninges - Nestas, vamos encontrar, como elementos diferenciais: alterações do sensório, febre alta desde o início (no tétano, só em formas graves ou complicadas), trismo (excepcional nas meningites).
- · Intoxicação por estricnina - Aqui encontramos a história de ingestão acidental ou intencional do tóxico; início brusco; delírio estricnínico e ausência de trismo.
- · Raiva - à esta se diferencia pela presença de uma história de mordida por animal suspeito, num período de 25 a 90 dias;_ convulsões, disfagia e espasmos laríngeos.
Epidemiologia
A epidemiologia do tétano é um assunto por demais extenso, sofrendo
influências regionais. Resumidamente, o tétano é de ocorrência mundial, sendo
menos frequentes nos países de clima frio, com melhores condições
socioeconômicas e onde medidas profiláticas por meio da vacinação da população
foram tomadas. Em nosso país é mais comum em crianças e adultos jovens,
predominando no sexo masculino e na zona rural. Nas regiões que apresentam
estações bem definidas é mais frequente no verão e primavera, não sendo tal
fato observado em regiões sem tal definição estacional. Tais fatos estão em
decorrência da maior exposição à infecção. A letalidade da doença é elevada,
sobretudo no tétano neonatal. Os focos de infecções mais frequentes são os
ferimentos.
Alguns
fatores influenciam sobre o individuo adquirir ou não a doença e estão listados
abaixo:
- · Nível socioeconômico e cultural.
É um fator
importante no determinismo do tétano, influindo decisivamente nos índices de
morbidade, mortalidade e letalidade. Quanto mais elevado o padrão higiênico,
cultural e econômico de um povo, menor a possibilidade da presença de condições
para o surgimento do tétano. O tétano umbilical comparece de maneira
impressionante nas estatísticas dos povos subdesenvolvidos, como consequência
direta da falta de assistência à maternidade nessas regiões. Quanto às atitudes
higiênicas, tais como lavar com água e sabão os ferimentos e medicá-los, mesmo
em casa, como antissépticos comuns, são medidas altamente eficazes na prevenção
do tétano, mas- pouco observadas entre indivíduos de baixo padrão cultural.
Outros fatores socioeconômicos estão também relacionados ao tétano. Assim, o uso de sapatos e vestuário adequados
para a proteção contra acidentes profissionais (luvas, botas ) constitui um dos
fatores que poderiam impedir, de maneira significativa, o surgimento do tétano.
- · Cuidados Primários.
Centenas de milhões
de indivíduos, povoando vastas áreas do globo, não têm acesso à assistência
médica. O tétano poderia, contudo, ser controlado por essas comunidades apenas
com a simples adoção de cuidados primários, elementares, de saúde, nos moldes
preconizados pela Organização Mundial de Saúde.
Ignorância, pobreza e medicina primitiva são responsáveis pela elevada
ocorrência de tétano, principalmente
umbilical, em todos os países subdesenvolvidos.
(Casos Reportados de Tétano Neonatal e Cobertura Vacinal (pelo menos 2 vacinas) das mulheres grávidas entre 1980 e 2013.) |
(Casos Reportados de Tétano e Cobertura Vacinal (pelo menos 3 vacinas) entre 1980 e 2013.) |
Quadro Clínico (Sintomas)
Os sintomas de
tétano podem ser divididos, pela ordem cronológica de aparecimento: primeiro tétano
local, segundo sintomas premonitórios, terceiro contratura permanente e quarto espasmos
paroxísticos (convulsões). O tétano local raras vezes é verificado pelo
paciente e caracteriza-se por rigidez ou espasmo dos músculos da região do
ferimento. Entre os sintomas, às vezes se encontram irritabilidade,
"beliscões", dores nas costas e nos membros. A contratura permanente
(rigidez muscular) acomete ora grupos musculares isolados (tétano localizado),
ora o que é mais comum, uma hipertonia generalizada, com predominância tanto
nos músculos da metade superior do corpo (formas altas) como nos membros
inferiores e abdome (formas baixas). A hipertonia de certos grupos musculares
confere feições características à doença, tais como trismo, riso sardônico,
opistótono, rigidez abdominal em tábua e rigidez de nuca. Essa rigidez muscular
pode permanecer por tempo variável, até alguns meses, sem, contudo, oferecer
muito perigo à vida do paciente. Os espasmos ou convulsões são violentas
exacerbações paroxísticas da hipertonia, determinadas por vários estímulos:
sonoros, luminosos, manejo do doente e alimentação. Esses espasmos levam o
paciente a um quadro asfíxico, com cianose e parada de respiração.
- Tétano Umbilical
O quadro clínico do tétano umbilical tem início entre cinco e 13 dias
após a contaminação da superfície de corte do cordão umbilical. Daí a
denominação popular de "mal dos sete dias". O primeiro sinal a
denunciar o tétano umbilical é a dificuldade do bebê em pegar o seio ou o bico
da mamadeira. Dentro de algumas horas, essa dificuldade se acentua, surgindo
trismo e disfagia. Ao colocarmos a ponta do dedo na boca do bebê, não
observaremos os movimentos reflexos de sucção. Os membros inferiores permanecem
em hipotensão, e os superiores em hiperflexão.
- · Tétano Localizado
É a forma de tétano em que a
hipertonia se inicia em determinado grupo muscular e aí permanece, delimitada,
sem- generalização ou apenas se propagando discretamente a grupos musculares
vizinhos.
Profilaxia
O tétano é uma das doenças que na atualidade
podem ser erradicadas, graças à vacinação. É devido a esta profilaxia ativa que
é considerado doença rara em vá rios países. A profilaxia ativa da doença é
feita pelo toxóide tetânico. A vacinação é realizada em três doses básicas,
sendo a 2ª dose realizada 21 a 30 dias depois da 1ª, e a 3ª de um mês a 12
meses após a 2ª. Após
a vacinação básica, é recomendável uma dose de reforço um ano após a 3ª dose
básica, e a seguir nova dose de reforço de 10 em 10 anos. No estágio atual dos
conhecimentos, recomendam-se as doses de reforço no sentido de aumentar o
título de antitoxinas, sendo opinião de alguns autores que a vacinação básica
talvez produza imunidade muito mais durável. Se a profilaxia da população, isto
é, fora de situação de risco de tétano imediato, está perfeitamente
estabelecida e sem ser alvo de crítica, o mesmo não ocorre no que diz respeito
à profilaxia de pessoa não vacinada que apresenta ferimento com risco de
tétano. Nestes casos as medidas profiláticas mais utilizadas são o uso da antitoxina
(SAT ou gamaglobulina hiperimune), uso de antibiótico e desbridamento do foco.
Qualquer que seja a medida ou medidas usadas, o importante é a sua precocidade,
visto que em 6 horas os esporos podem germinar e passar a produzir a toxina.
O desbridamento do foco
encontra, na profilaxia, sua perfeita indicação porque a ausência de condições
de anaerobiose e a retirada do material infectante são elementos por si só
altamente eficazes na prevenção da doença. O uso da SAT ou gamaglobulina humana
hiperimune contra tétano é recomendado na hipótese de não se retirarem todas as
condições que favorecem a germinação do bacilo e, assim, as quantidades de
toxina produzidas serão neutralizadas pela antitoxina. Quanto ao uso de
antibióticos, vários trabalhos demonstram que a penicilina e tetraciclinas
utilizadas precocemente, isto é, até 6 horas após a infecção, são eficazes na
inibição do germe e, portanto, não ocorre a produção de toxina. Os antibióticos
devem, no entanto, ser utilizados em dose terapêutica adequada e por tempo
prolongado, pelo menos até que o ferimento entre em cicatrização.
Tratamento
- · Enfermagem: prevenir estímulos desencadeadores, cautela na mobilização e medicação, atendimento aos espasmos (drogas relaxantes), vigilância sobre evolução e suporte psicológico.
- · Neutralização da toxina não fixada: Soro antitetânico (SAT) animal, que exige testes de sensibilidade (exceto neonatal), ou imunoglobulina antitetânica (IGHAT), que não exige melhores aplicadas via intratecal. Visam evitar novas produções e fixações da toxina nos receptores nervosos, combatendo sintomas até elas serem metabolizadas e eliminadas.
- · Combate ao C. tetani: desbridamento do foco e retirada anaerobiose (preserva recaídas por presença do esporo) + antibióticos (penicilina cristalina ou metronidazol) que agem sobre a forma vegetativa.
- · Assistência ventilatória: manutenção da via aérea, oxigênio, nebulizações, aspiração de secreções das vias.Traqueostomia em casos de retenção da secreção, disfagia intensa, crises de apneia, contraturas/espasmos frequentes, infecção pulmonar, coma etc. (evitada no neonato).
- · Cuidados gerais: prevenção de escaras, uso de vitaminas e antitérmicos, curativos com substâncias oxidantes
Bibliografia:
Veronesi, Ricardo. Doenças infecciosas e parasitárias. 8ª ed. Rio de Janeiro Guanabara Koogan, 1991. 1082 p.
TAVARES, Walter. O Clostridium tetani e o Tétano. SCIELO Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0037-86821973000100007>. Acesso em: 11.jul.2017
MINHA VIDA. Tétano - Sintomas, Tratamento e Causas. Disponível em <http://www.minhavida.com.br/saude/temas/tetano>. Acesso em 12.jul.2017
PEDROFFUP. Toxina Tetânica. Disponível em <http://pedroffup.wixsite.com/toxina-tetanica>. Acesso em 13.jul.2017
Portal Brasil. Casos de Tétano no Brasil de redução de 44%. Disponível em <http://www.brasil.gov.br/saude/2012/10/casos-de-tetano-no-brasil-tem-queda-de-44>
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SCIELO. O tétano e a vacinação anti-tetânica. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/rsp/v10n2/03.pdf>. Acesso em 11.jul.2017
PUB.MED. [Alternative approach to autonomic instability of very severe tetanus]. Disponível em <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/m/pubmed/28551062/?i=1&from=tetano> Acesso em 11.jul2017
Institudo Federal do Rio de Janeiro
Ighor Barbosa de Souza
BM 161
14/07/2017
Ficou muito bom!
ResponderExcluirBem top esse trabalho, hein.
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